Nossa pesquisa sobre os mascarados de carnaval venceu o prêmio de criação de roteiro longa-metragem do Fundo de apoio à Cultura do DF.
O Brasil é conhecido pelo carnaval exótico e colorido. Os mascarados fazem dessa fauna de personagens folclóricos carregados de mistério e ludicidade. Assumem diferentes identidades em cada lugar do país, no nordeste existem os papangus, os cariocas tem verdadeiras competições de turmas de bate-bolas, também conhecidos como Clóvis; em Brasília uma identidade carnavalesca começa a se formar ano-a-ano com turmas de mascarados – e os mascarados se espalham por todos os estados do Brasil assumindo diferentes formas.
O projeto de pesquisa resultou na criação do roteiro-longa metragem “Mascarados”
Viajamos para conhecer de perto os mascarados do Espírito Santo, locação principal do roteiro que estávamos produzindo. Lá, eles se chamam apenas de “Mascarados”, se concentram em pequenas cidades do interior do ES, mas estavamos interessados especificamente nos mascarados de uma vila de pescadores chamada “Barra do Jucu”, conhecido pela melodia adaptada dos cantos folclóricos das lavadeiras por Martinho da Vila.
Eu fui lá pra Vila Velha 
Direto do Grajaú 
Só pra ver a Madalena 
E ouvir tambor de congo 
Lá na barra do Jucu
Só pra ver a Madalena 
E ouvir tambor de congo 
Lá na barra do Jucu 
Oh! Madalena
– Martinho da Vila
*Desenhos meramente ilustrativos - a obra será um filme com atores.
OS MASCARADOS DA BARRA DO JUCU
Ao visitar a Barra do Jucu para a pesquisa, descobrimos que os mascarados de lá tem todo um conjunto de costumes e ritos muito próprios, muito individuais, que se destacam dos demais mascarados.
A brincadeira começa antes do carnaval, quando os mais velhos e as crianças reúnem roupas velhas, botas, sapatos velhos, máscaras de papietagem, máscaras de borracha, capuzes, casacos rasgados, meias e qualquer coisa que possa cobrir todo o corpo para não serem identificados.

Pintura do artista plástico barrense, Kleber Galvêas – Antigamente, após a abolição da escravidão, os negros não podiam participar das folias, por isso se fantasiavam, sem deixar nenhuma parte do corpo a mostra.

A brincadeira de carnaval da Barra do Jucu sempre teve uma quantidade enorme de mascarados e foi considerado o carnaval mais representativo do Espírito Santo nas décadas de 1980 e 1990. Por ser uma vila pequena, quase todos se conheciam, e as brincadeiras eram respeitadas sempre de forma saudável. Tudo começa quando eles se reuniam em uma clareira no mato para beber e fazer bagunça enquanto se aprontavam e vestiam as máscaras. Geralmente as crianças não podiam fazer parte desse momento, era restrito aos mais velhos. E depois dessa concentração, os mascarados saiam nas ruas pregando peças nas pessoas, correndo atrás das crianças e pulando carnaval. As crianças mascaradas formavam grupos independentes dos adultos, mas quando se aproximavam os mascarados adultos elas tinha que fugir para não serem “zoadas”.
Na década de 2000 o carnaval da Barra perdeu muita força. Com o aumento da população, cresceu também a violência, e as brincadeiras antes sadias, agora eram mais perigosas, pois os mascarados muitas vezes topavam com gente na rua que andava armado. E brincar com essas pessoas nunca era boa idéia. Por medo, os mascarados foram deixando de existir, foram diminuindo em número, mas de 2010 um novo movimento busca retomar as tradições e trazer de volta os mascarados para o carnaval barrense.
A HISTÓRIA
Mascarados é uma história sobre fraternidade, reencontros e despedidas. É uma história sobre crianças, mas também é feita para adultos, serve para nos lembrar do espírito infantil, das brincadeiras e fantasias que criamos quando crianças. Não fica fácil classificar Mascarados em um gênero, mas pode ser visto como um drama familiar, apesar de em certos momentos alternar o clima geral entre aventuresco e suspense, muito semelhante aos filmes italianos.
Pedro (14 anos) e Ana (8 anos) vivem numa casinha pequena da Barra do Jucu com seu pai Arturo. Pedro está ansioso para o carnaval desse ano, pela primeira vez ele vai pular carnaval com os mascarados mais velhos. Ana se tornou fascinada pelos mascarados, apesar de ainda se sentir amedrontada por eles e ela quer ir junto. Pedro está incomodado com a presença da irmã que vai atrapalhar mais do que ajudar, mas Arturo obrigou: “Se vai pro carnaval, tem que levar e cuidar da sua irmã”. Nesse processo Pedro fica dividido entre ser legal para os amigos mais velhos e vigiar cada ação da irmã. Os mascarados são uma brincadeira principalmente de meninos, e Ana não é aceita, apesar disso, ela se mantém sempre perto de Pedro. Outro amigo das crianças é Nicolo, uma criança presa no corpo de um homem de 40 anos. Nicolo tem a mentalidade de uma criança, e por isso é um dos melhores amigos das crianças e anda sempre com eles.
Nesse meio tempo, a rotina da família é alterada pela chegada inesperada de uma meio-irmã desconhecida, de outro casamento do pai. Valéria é filha do primeiro casamento de Arturo, ela não vê o pai há mais de dez anos, mas cultivou em todo esse tempo um respeito pelo pai. Ouviu da mãe histórias de que ele era um poeta, um pintor, um escritor e cresceu sabendo disso. Valéria faz uma viagem de mochilão para passar uns dias com sua família desconhecida e acaba se apegando por todos eles, ela cria amizade com Pedro e com Ana, e confronta a nova realidade do pai, Arturo, que largou a arte para se tornar mecânico de carros, o que de certa forma, decepciona a filha. Apesar disso, ambos ficam saudosos ao lembrar da mãe de Valéria e as crianças começam a enxergar a irmã mais velha cada vez com mais carinho.
Durante o carnaval muitas coisas acontecem, colocando a prova as relações familiares e no momento em que Valéria precisa ir embora de volta para a cidade de onde veio, tudo se complicará.
MOTIVAÇÃO
Gustavo Serrate, roteirista
“O primeiro motivo para fazer esse filme é um motivo pessoal. O carinho que tenho pela Barra do Jucu e pelo carnaval de mascarados é uma lembrança de infância impregnada de mistério e curiosidade. Todos os personagens do filme carregam um pouco das motivações: Pedro é o guia, o que conduz os mais novos a brincadeira, mesmo que a contragosto. Ana representa o fascínio e a vontade de não só conhecer de perto essa cultura bonita e assustadora, mas de fazer parte dela. Nicolo é a inocência, a criança interior que não foi embora com a chegada da vida adulta, e ainda sabe brincar. Valéria é o espírito forasteiro que se infiltra em uma nova cidade e não só absorve e participa das tradições locais, mas passa a se sentir parte dela. Aurélio é a necessidade do retorno, a vida prática, os compromissos e obrigações e Arturo é o guardião e mantenedor de toda essa cultura onírica, mesmo estando afastado dela, cabe a ele o papel de preservar e de fazer perdurar, educando os mais novos.
Sobre a Barra do Jucu, não tenho notícia de nenhum outro filme que tenha como cenárioesse lugar, se fosse uma cidade do Rio de Janeiro talvez já tivessem feito dezenas de filmes aqui, mas o Espírito Santo às vezes aparece como uma nulidade cultural no Brasil, queremos mudar isso. É uma forma de estabelecer uma ponte cultural com cidadãos e artistas do Espírito Santo e de Brasília, reforçar que o Brasil não é apenas RJ e SP. Há histórias e muita energia cultural espalhada por ai que precisa ser vista, conquistada, mostrada, ocupada.
Reacender a cultura tradicional da Barra do Jucu, aquele carnaval ingênuo e bonito que remonta aos tempos antigos. Não podemos deixar o medo da violência vencer nossa vontade de sair às ruas e manifestar nossas mais profundas necessidades humanas nas brincadeiras de carnaval. Desde sempre a humanidade tem necessidades que se repetem, por mais que a civilização se transforme. O humano cria seu Deus, aonde quer que esteja, o ser humano também cria sua necessidade de extrapolar, de festejar no carnaval, grandes festas carnavalescas repetem-se na África, na Europa, na Ásia. Não é diferente aqui, a livre manifestação, o festejar é um impulso humano arquetípico que precisa de espaço para vazão”.
EQUIPE DE PESQUISA
Gustavo Serrate – Roteiro e direção
Juana Miranda – Produtora de Brasília responsável pela criação e pela gestão do projeto
Thiago Pinho – Assistente de produção DF
Úrsula Dart – Produtora do Espírito Santo responsável pela pesquisa de locação e elenco e produção do teaser
Bob Redins – Produtor de campo – ES
Filipe Gontijo – Consultor de Roteiro
Ana Saggese – Assistente de roteiro
Rodrigo Huagha – Argumentista
Tiago de Aragão – Assistencia de direção, criação de uma previsão de projeto técnico
Gabriel Roque – Designer
Vinícius Oliveira – Pesquisador / Consultor
Fefê Torquato – Ilustradora
QUE SABER MAIS?
No blog do projeto fazemos constantes atualizações sobre o processo de pesquisa que já aconteceu, sobre o andamento do projeto e também sobre o assunto, que são mascarados brasileiros e de todo o mundo. Acesse.

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